Nos dias de hoje é muito comum vermos casais preocupados com a quantidade de filhos. Mas na verdade, essa preocupação sempre existiu. Muito antes do advento da pílula anticoncepcional, os casais já tentavam “evitar filhos” usando o famoso método da “tabelinha”, que sempre apresentou muitas falhas. Se olharmos para um passado ainda mais distante, veremos que outros métodos já vinham sendo utilizados ao longo de muitos séculos, como os preparados à base de produtos naturais, que poderiam causar um efeito contraceptivo ou abortivo.

No entanto, foi apenas na década de 60 que surgiu a pílula anticoncepcional. Uma pílula “milagrosa”, aquela que parecia resolver todos os problemas da humanidade. A partir de então, ninguém mais precisaria se preocupar com uma possível gravidez, porque a “inofensiva” pílula faria com que a mulher não mais engravidasse.

O que a sociedade vivenciou desde então foi uma rápida expansão do “sexo livre”, uma vez que ele não estaria mais vinculado à gravidez. Se porventura uma gravidez viesse a acontecer, também não haveria mais motivos de preocupação, pois a cultura contraceptiva já instalada deu margem para a popularização do aborto na década de 70. Tudo isso financiado por grandes e bilionárias instituições que visavam (e ainda visam) o controle populacional.

Como resultado destes grandes acontecimentos do século XX, hoje temos a liberdade individual e a possibilidade de controlar a quantidade de filhos. Certo? Errado! Como resultado, hoje vivenciamos uma degradação completa de valores familiares e a desvalorização mútua, pois as pessoas passaram a “usar” outras pessoas sem darem-se conta das graves consequências de toda essa “liberdade sexual”: depressão, ansiedade, consumo elevado de álcool e drogas, relacionamentos inconsistentes, desvalorização de pessoas, solidão, insegurança. Tudo isso como consequência de “estar na moda” e deixar de ser “ultrapassado e submisso”.

O opositor solitário

Diante de todo o desenvolvimento tecnológico da década de 60, o mundo se via deslumbrado com o advento da pílula contraceptiva e foi incapaz de perceber as consequências negativas que esses avanços poderiam trazer à sociedade. Um dos poucos que alertou sobre as prováveis consequências do uso desses métodos contraceptivos artificiais foi incompreendido e rechaçado por aqueles que se consideravam sábios e detentores do conhecimento. Foi necessário que se passasse 50 anos de mais desenvolvimento tecnológico e científico para que uma parcela da sociedade começasse a compreender, ainda que de forma limitada, aquilo que aquele homem – opositor solitário – alertava com grande fundamentação.

Aquele homem era Paulo VI.

Com sabedoria, auxiliado e guiado pelo Espírito Santo, o Papa Paulo VI questionou severamente algumas questões sobre as quais a sociedade moderna não queria ouvir falar: se cabe ao homem moderno confiar à sua razão e vontade – mais do que aos ritmos biológicos dos organismos – a tarefa de transmitir a vida.

O Papa também falou sobre algo que o mundo – naquele momento e até hoje – via como retrógrado: o amor conjugal e seus aspectos inseparáveis: a união e a procriação. Ou seja, ao mesmo tempo em que o ato conjugal une profundamente os esposos, torna-os aptos para a geração de novas vidas. Esse amor conjugal requer um necessário domínio de suas paixões, e somente alguém que não é refém de sexo livre é capaz de fazer: utilizar de sua razão para controlar suas vontades, sejam elas relacionadas ao controle natural da natalidade dentro do matrimônio (quando há motivo grave para tal) ou até mesmo para não cair em infidelidade e relacionamentos extraconjugais.

Ele compreendeu tudo sobre a pílula desde o seu advento

Paulo VI, na década de 60, parecia dizer com exatas e proféticas palavras o que estamos vivendo hoje: “é ainda de recear que o homem, habituando-se ao uso das práticas anticoncepcionais, acabe por perder o respeito pela mulher e sem se preocupar mais com o equilíbrio físico e psicológico dela, chegue a considerá-la como simples instrumento de prazer egoísta e não mais como a sua companheira, respeitada e amada” (Humanae vitae, ponto 17).

Ou seja, enquanto a sociedade moderna vai aos poucos transformando a mulher em um mero e descartável objeto de prazer, Paulo VI, nas entrelinhas, exalta a mulher como este ser que deve ser amado e respeitado por seu companheiro, para viverem juntos o plano de Deus para suas vidas. Não uma vida solitária, mas uma vida a dois.

Paulo VI descreveu uma das graves consequências do uso da pílula contraceptiva, que banaliza o ato conjugal, transformando-o em um mero ato sexual, que não mais está vinculado com procriação e – muito menos! – com união conjugal. Essa situação degrada e desvaloriza a mulher, que passa a ser um mero objeto de prazer e descarte em função da vivência dessa “liberdade sexual”, tão pregada e até cantada em canções de rock daquela época, levando à um estado de desvalorização que gera transtornos psicológicos gravíssimos (isso sem mencionar os efeitos colaterais causados pela pílula contraceptiva – por vezes, graves – que podem acometer as mulheres).

No entanto, não é só a mulher que sofre (mesmo sem se dar conta que sofre, pois acha que essa é a vida que todas as pessoas devem levar nos dias de hoje). Os homens também sofrem, porque não entendem o sentido da vida. Em algum momento tardio de sua vida, ele vai perceber o quanto essa vida cheia de “liberdade” é vazia.

Muitas pessoas vivem hoje uma crise gravíssima de falta de sentido para a vida. Não há mais necessidade de controlar seus instintos, suas paixões, suas vontades; não há mais necessidade de procurar uma pessoa para ser companheira de vida porque isso é “retrógrado”; não há mais necessidade de valorizar o corpo como bem dado por Deus e templo do Espírito Santo; não há mais necessidade de idealizar planos familiares que culminarão na perpetuação daquelas vidas por meio de sua descendência.

Hoje vale tudo pela “liberdade”: vale viver em solidão, com crises existenciais que por vezes beiram o pânico; vale “usar” pessoas ou se deixar ser usada, por uma vez ou duas, ou até mesmo por alguns meses, para depois descartar, porque matrimônio é “retrógrado”; vale usar o corpo para atrair o sexo livre; e vale usar a pílula para usufruir do sexo livre; afinal de contas, o que vale mesmo é a “liberdade”.

Olhando para as décadas que passaram, é muito fácil perceber que a Igreja foi a única que acertou. E ela acertou há 60 anos, quando todos discordaram dela. Foi necessário mais de meio século para começarmos a compreender melhor aquilo que havia sido alertado por aquele opositor solitário. Porém, ainda presos ao mesmo paradigma cientificista da época, começamos a nos dar conta dos efeitos colaterais e consequências físicas e psicológicas da pílula, mas ainda nos falta compreender mais profundamente a essência de todos os ensinamentos que Paulo VI nos deixou em sua encíclica Humanae vitae em termos morais e espirituais.

(Postado originalmente no site Modéstia e Pudor)