O que é, de fato, a paternidade responsável?

Hoje em dia, ser responsável significa ter poucos filhos. Não é raro a gente ouvir comentários que “fulana” engravidou porque foi irresponsável. Se um casal tem muitos filhos, são facilmente taxados de irresponsáveis. Até mesmo atualmente, entre os católicos já mais conscientes sobre a fecundidade matrimonial, pode ainda haver dúvidas e confusão sobre esse assunto.

Desde a década de 1960, com o surgimento da pílula anticoncepcional, a mentalidade contraceptiva tomou conta da sociedade em geral, gerando uma visão distorcida sobre a responsabilidade na paternidade ao desassociar a geração de filhos do ato conjugal. Essa nova visão de casamento, sexualidade e vivência conjugal coloca a geração de filhos como um aspecto opcional, regulado por conveniências pessoais e sociais, em vez de ser parte essencial do matrimônio.

A possibilidade de controlar a geração de filhos levou a sociedade a interpretar “responsabilidade” não como um dever e um chamado à generosidade e ao respeito pela vida, mas como uma obrigação de limitar a quantidade de filhos. A consequência disso é a visão atual tão comum de julgar quem tem poucos filhos de “responsável” e quem tem muitos filhos de “irresponsáveis”, “imprudentes”, etc.

Mas, afinal, o que é paternidade responsável?

O Papa Paulo VI explica no ponto 10 da Humanae vitae, que o amor conjugal requer nos esposos uma consciência da sua missão de paternidade responsável, sobre a qual hoje tanto se insiste, e que deve ser compreendida com exatidão:

“Em relação com os processos biológicos, paternidade responsável significa conhecimento e respeito pelas suas funções: a inteligência descobre, no poder de dar a vida, leis biológicas que fazem parte da pessoa humana.”

Isso significa que os esposos devem conhecer e respeitar as leis naturais do corpo humano, tanto feminino quanto masculino, em sua capacidade de gerar a vida. Esse conhecimento é essencial para reconhecermos e valorizarmos a fertilidade como um dom, como um privilégio de gerar vidas, colaborando com Deus em sua Criação. Somos chamados a respeitar a fertilidade como parte intrínseca da mulher, do homem, e do casal, mas infelizmente, nos nossos tempos, a fertilidade é vista como um problema ou doença que deve ser tratada.

Os métodos artificiais de controle de natalidade interferem diretamente na fertilidade feminina, desligando-a, e gerando, com isso, inúmeros efeitos colaterais. Ao mesmo tempo, “desliga” a fertilidade do casal, retirando de seu ato conjugal o aspecto procriativo, e assim, reduzindo a sua importância e dignidade, e distorcendo o seu real significado.

Já os métodos naturais de observação da fertilidade ajudam o casal a conhecer e valorizar a fertilidade, enxergando-a como do casal, e não apenas da mulher ou do homem. Os métodos naturais ajudam o casal tanto a conceber quanto a espaçar um nascimento. Esse conhecimento valoriza a integralidade da pessoa humana, criada por Deus, sendo a fertilidade sua parte intrínseca. Além de valorizar a individualidade feminina e a masculina, também valoriza e enobrece o amor matrimonial e a geração de uma nova vida.

“Em relação às tendências do instinto e das paixões, a paternidade responsável significa o necessário domínio que a razão e a vontade devem exercer sobre elas.”

O casal é chamado a viver um amor maduro, onde a atração física e os impulsos naturais da sexualidade são vividos de forma ordenada. O respeito ao outro e a dignidade do outro deve ser uma prioridade, e a compreensão do plano de Deus para o matrimônio deve reger os instintos e as paixões.

Em outras palavras, enquanto a atração e o desejo são naturais e fazem parte do relacionamento conjugal, a paternidade responsável requer que o casal vá além de uma visão puramente instintiva da sexualidade, elevando-a ao nível da razão e da vontade, e inclusive da transcendência. A razão (o entendimento) orienta os impulsos e ajuda a vivê-los de maneira ordenada, preservando o amor e visando o bem do cônjuge. Quando o casal busca essa vivência, ele não nega a importância do desejo, mas o integra à sua missão maior dentro do amor conjugal, respeitando os processos biológicos e a abertura à vida, conforme o plano de Deus para o matrimônio. Saber controlar os instintos e as paixões é importante quando surgir alguma fase da vida em que seja necessário viver a abstinência.

A capacidade de dominar seus instintos e paixões é a verdadeira liberdade. A pessoa decide livremente controlar impulsos e paixões em vista do bem do outro e do seu casamento. Não conseguir controlar seus impulsos e paixões revela uma escravidão, uma prisão aos seus vícios, o que pode levar às desavenças e até mesmo à infidelidade conjugal.

“Em relação às condições físicas, econômicas, psicológicas e sociais, a paternidade responsável exerce-se tanto com a deliberação ponderada e generosa de fazer crescer uma família numerosa, como com a decisão, tomada por motivos graves e com respeito pela lei moral, de evitar temporariamente, ou mesmo por tempo indeterminado, um novo nascimento.”

O casal, unido em matrimônio, deve ter a capacidade de analisar, com maturidade e com generosidade, todos os aspectos da sua vida, sejam eles físicos, econômicos, psicológicos ou sociais. No texto da encíclica, o Papa deixa claro o chamado à generosidade de fazer crescer uma família numerosa, mas também explica que se pode tomar a decisão de evitar um nascimento temporariamente ou mesmo por tempo indeterminado, caso haja um motivo sério para isso, e respeitando a lei moral (como falamos sobre os aspectos biológicos).

Perceba que não há uma lista clara e detalhada sobre quais são esses motivos justos, sérios e graves, pois seria impossível listar uma infinidade de situações e circunstâncias. Mas podemos buscar analisar esses pontos para oferecer ao leitor mais oportunidades de reflexão:

Em relação aos aspectos físicos, poderíamos citar situações graves de saúde que requerem um espaçamento de filhos para a preservação da saúde e da vida da mulher.

Por isso, é de responsabilidade do casal fazer essa avaliação.

E como fazer? É preciso, antes de tudo, de vida de oração e vida sacramental, para que o Espírito Santo ilumine a alma, aberta à Graça, para que analise corretamente as situações e tome a decisão mais acertada. A direção espiritual é também muito importante nesse processo. Infelizmente, com a mentalidade contraceptiva tomando conta da sociedade, qualquer situação mais simples pode ser tomada como um motivo justo para evitar a chegada de um novo filho. Mas somos chamados a retificar nossas intenções para o bem e para a vontade de Deus, de forma a não cedermos às ideias atuais e às inclinações egoístas.

“Paternidade responsável comporta ainda, e principalmente, uma relação mais profunda com a ordem moral objetiva, estabelecida por Deus, de que a consciência reta é intérprete fiel. O exercício responsável da paternidade implica, portanto, que os cônjuges reconheçam plenamente os próprios deveres, para com Deus, para consigo próprios, para com a família e para com a sociedade, numa justa hierarquia de valores.”

Vejam que Deus nos criou e criou as leis que nos regem, e que estão inscritas no nosso coração. Por exemplo: todo mundo sabe que é errado atentar contra a vida de outra pessoa. A nossa consciência nos acusa quando fazemos algo errado porque as leis de Deus estão inscritas no nosso coração e elas nos indicam o que é bom e o que é mau.

O Catecismo da Igreja Católica diz: “Mediante a sua razão, o homem conhece a voz de Deus que o impele a fazer o bem e a evitar o mal. Todos devem seguir esta lei, que ressoa na consciência e se cumpre no amor de Deus e do próximo. O exercício da vida moral atesta a dignidade da pessoa (1706).

Nesse sentido, o autêntico amor conjugal, conforme a ordem moral estabelecida por Deus, é aquele vivido com entrega total, em suas finalidades unitiva e procriativa.

“Na missão de transmitir a vida, eles não são, portanto, livres para procederem a seu próprio bel-prazer, como se pudessem determinar, de maneira absolutamente autônoma, as vias honestas a seguir, mas devem, sim, conformar o seu agir com a intenção criadora de Deus, expressa na própria natureza do matrimônio e dos seus atos e manifestada pelo ensino constante da Igreja.”

Ou seja, o Papa diz que, na missão de transmitir a vida, o casal não é livre pra proceder a seu próprio bel-prazer, mas deve conformar o seu agir com a intenção criadora de Deus, que está expressa na própria natureza do matrimônio, com a união conjugal podendo gerar novas vidas.

É claro que, como o Papa explica no ponto 11, o ato conjugal, no qual se transmite a vida humana, é honesto e digno, e não deixam de ser legítimos se, por causas independentes da vontade dos cônjuges, se prevê que vão ser infecundos. 

Em síntese, ao compreender e viver a paternidade responsável, os casais se tornam participantes do plano divino, reconhecendo que cada filho é um dom e uma oportunidade de amar mais profundamente. Assim, a verdadeira responsabilidade não está em evitar os filhos, mas em acolhê-los e educá-los de maneira a refletir o amor e a vontade de Deus no mundo.

Rolar para cima